Eu estava no último ano do antigo Ginásio, em Capinzal, ano de 1968. Ginásio Normal Juçá Barbosa Callado, formava professores para ensinar no Ensino Primário. Meus professores, em sua maioria, eram profissionais liberais. Outros haviam cursado o Segundo Ciclo Secundário, era assim que chamavam o antigo "Normal", hoje Magistério em nível de Ensino Médio.
Uma jovem professora fora contratada para nos ensinar Português. Não havia professores licenciados na cadeira naquela época na cidade. A professora era mais jovem do que a maioria dos alunos, uma vez que boa parte deles havia retomado os estudos com a introdução de uma Ginásio Noturno. Antes disso, apenas o Padre Anchieta e o Mater Dolorum ofereciam o ensino secundário em seus primeiro e segundo ciclos, ambos no período matutino. O início do ensino à noite abriu possibilidades para aqueles que precisavam trabalhar durante o dia. Eu fui um deles.
Acostumado a morder as pontas das canetas esferográficas, (que anos depois o professor Geraldo Feltrin ensinou-me que era uma "ball-point-pen", ou seja, uma caneta com ponta de bola, daí esferográfica), eu ficava com os lábios e a língua sujos de tinta azul. E os dedos da mão direita também. As canetas-tinteiro, então, faziam estragos em mim, inclusive nas roupas. Mas houve um dia daquele mês de março de 1968 em que algo mudou, definitivamente, em minha maneira de ser, e isso resultou no perfil que conservo até hoje: um apaixonado por ler e por escrever!
Minha mente remeteu-me, hoje, ao tempo de minha adolescência, fazendo-me voltar 45 anos atrás, às carteiras de Ginásio, ali onde hoje está nossa majestosa Escola de Educação Básica Belisário Pena. Aos professores João Bronze Filho, Paulo Bragatto Filho, Deoni Maestri, Adelino Frigo, Waldemar Baréa, Iria Flâmia, Holga Brancher, e à jovem e dinâmica Vera Lúcia Bazzo, estreante em ensinar-nos nosso Português.
Falou-nos a Vera da importância de as pessoas escreverem, dizerem o que sentiam, colocar no papel a opinião sobre as coisas e os fatos, escrever histórias. E nos deu um tema para que fizéssemos uma redação, não importando a modalidade, podia ser narração, descrição, dissertação, poesia, desde que dentro do tema indicado.
Peguei uma dupla folha de papel almaço, mentalizei uma história, narrei, descrevi ambientes e personagens, dei um cunho relativamente moral, fiz o bem sobrepor-se ao mal e lasquei-lhe um final feliz! Eu lera muitos livros, fotonovelas, gibis, revistinhas do Walt Disney, gostava de ler. Então encorpei uma espécie de conto utilizando as quatro páginas. Caprichei na letra, coloquei travessões nas interlocuções, respeitei o distanciamento na margem esquerda da página para indicar cada parágrafo, respeitei o traço de uma margem imaginária de uns dois centímetros à direita e três à esquerda, distribuí bem a matéria na página. Ficou bonitinho. Eu nunca entregara uma redação ou trabalho razoavelmente organizado em toda minha vida escolar. Mas, naquele dia, consegui!
Na aula seguinte, a professora foi devolvendo as redações aos alunos, tecendo comentários elogiosos a uns, fazendo observações pertinentes e pontuais a outros, tudo de maneira muito sutil, educada, jeitosa. E, por último, a minha redação. Eu já estava ficando assustado. Era acostumado a ver colegas zoando de mim, não ganhar elogios. ( E nem os merecia...)
"De onde você tirou isso, Euclides?" - "Ih, lá vem bomba de novo, pensei!" - Os colegas olhavam-me e eu estava apreensivo. A professora Vera começou a fazer as observações sobre a organização do meu texto, sobre a verossimilhança que nele havia, pois a história, embora inventada, parecia verdadeira, cativante, atrativa. Ortografia perfeita, pontuação ideal, uma ótima composição, uma nota que eu jamais ganhara na área. Mas, mais do que a nota, foi-me prazeroso ouvir, pela primeira vez, um elogio por algo que eu mesmo criei, que era meu, só meu, defitivivamente meu! E nunca mais parei. Este é meu 500º texto que estou publicando no meu blog. Escrevo porque gosto!
Obrigado, professora Vera!
Euclides Riquetti
05-10-2013
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