
Setembro de 1980, eu havia voltado há poucos meses ao Ouro.
Lecionava na Escola Sílvio Santos. Em setembro, a oportunidade de ganhar
um dinheirinho extra. Fui contratado para trabalhar durante o mês na
execução do serviço de recenseamento de toda a área urbana do município.
Lá fui eu, de casa em casa, mapa da cidade na mão, maletinha do IBGE
sob o braço. Era a época ideal para isso, estávamos fugindo do
Inverno, prestes a chegarmos à Primavera.
Meu supervisor era o Rogério Baretta. Fizemos, em agosto, o
treinamento nas dependências do antigo Ginásio Padre Anchieta,
juntamente com o pessoal de Capinzal. Naquela cidade, lembro que havia o
Bragato e o Régis Golin atuando. Eu tinha outros companheiros: o Dirceu
Cadore, popular Cadorna, na ára rural, e Francisco Miquelotto, na
região de Linha Sete de Setembro. Lembro bem desses.
Eu havia ficado oito anos morando fora, entre Porto União da
Vitória e Duas Pontes, hoje Zortéa. Muitas pessoas não me conheciam
mais. Comecei pelo centro da cidade, fui para o Bairro Navegantes e
depois para o Parque e Jardim Ouro. Havia, no máximo, trinta famílias
somando-se os dois bairros.
Tenho alguns fatos que ficaram fortemente registrados em
minha memória. Primeiro, quando fui fazer o censo na casa do João
Tessaro, ali na Rua Pinheiro Machado, ao terminar, agradeci a atenção da
Dona Jaci e ela foi cuidar de seus afazeres domésticos. Ao descer da
escada, revestida com cacos de cerâmica, foi "um tombo só". Fui parar lá
na rua. Olhei para todos os lados e não vi ninguém, graças a Deus. Ia
ser uma vergonha para mim. Uns pequenos esfolões, mas o produto do meu
trabalho estava salvo: a maleta preservada, com os formulários dentro.
Os óculos, que voaram longe, também intactos. Bem, os esfolões seriam
resolvidos com um pouco de mertiolate...
Dias depois, o maior e mais inesperado ( e inusitado)
acontecimento da história de minha cidade: o assalto ao Banco
Bamerindus. Lá trabalhavam alguns amigos e alunos, dentre eles: Minha
futura cunhada, Marise Früauf, a Zanete Helt (Miqueloto), que virou
minha comadre, O Ladir Reina, filho do Texaco, o Ivan Vitorazzi,
sobrinho de minha madrinha Raquel, e o vigia, Onorino da Silva, irmão do
Terto, e outros.
Três bandidos, sendo um menor em idade, que vieram de São
Paulo para trabalhar na construção de um frigorífico em Capinzal,
realizaram o assalto ao Banco, no horário de almoço. Lembro que
fecharam alguns funcionários no banheiro. Minha cunhada estava voltando
do almoço com meu irmão, Piro, e viram que o assalto estava
acontecendo. Tiveram sorte. Funcionários, como o Texaco e o Onorino,
foram feridos.
A notícia espalhou-se em instantes pela cidade.As pessoas
colocaram um caminhão atravessado em cada saída da Felip Schmidt para
que os assaltantes não pudessem fugir. Lembro que algumas pessoas
atiravam contra o Banco, como o Sr. Santo Segalin, com espingarda, e o
Rangel, conhecido como "Alemão da Carlota", com seu 38.
Mas a bravura maior veio com o então Delegado de Polícia,
Sargento Pedro Morosini, que adentrou à agência dando tiros nos
bandidos. Até saía fumaça pela porta, de tantos tiros trocados. Quando
acabaram as balas, de ambos os lados, os assaltantes partiram de faca
para cima do amigo Mosorini, que acabou sendo projetado por sobre um
banco de corvin preto (aquele em que a gente senta na frente do gerente
para pedir empréstimo...) e ficou defendendo-se com os pés. Levou
golpes de faca na cabeça, tendo, inclusive, restado uma ponta de faca
alojada ali próximo do cérebro. E alguns chumbos de tiros de espingarda
restaram cravados em seu pé.
Foi um grande e sangrento combate: Ao final, dois assaltante
mortos, estendidos ao chão. E o menor, sendo conduzido a pé, pelo
Carleto Póggere, que o segurava pelo pescoço com o braço esquerdo e
carregava seu revólver na mão direita. Encontrei-o e ele me disse: "Esse
não vai incomodar mais ninguém", e o levou para a Cadeia do Ouro. Este,
depois, foi recambiado para São Paulo, terra de origem.
O Delegado Morosini teve muitos ferimentos. Mas, com coturno
nos pés, defendeu-se bravamente dos golpes de faca desferido contra ele.
E teve muita sorte de sobreviver.
Nos dias que se seguiram, o pânico rondava as casas. Mal
escurecia e todos trancavam portas e janelas. O trauma levou muitos
meses para ser amenizado. Eu lembro que, quando fui fazer o censo na
casa do Serafim Andrioni, a esposa dele não queria abrir a porta porque
não me conhecia. E, na época, a cidade tinha 6.000 habitantes. Só depois
que eu disse que era o filho do Guerino Riquetti que havia estudado em
Porto União e voltado para casa, que ela concordou em abrir.
Seguramente,o assalto foi um fato que ficará registrado em
nossa Hístória. Já são 37 anos passados. Mas, coisas assim, a gente não
esquece nunca...
Euclides Riquetti