Sapateiros estiveram presentes na vida das pessoas desde que
inventaram as sandálias, os primeiros calçados disponíveis ao homem. O
objetivo, primordialmente, era o de proteger as solas dos pés, não o de
adorno. Isso há mais de 10.000 anos. Depois vieram as botas, os
botinões, as botinas, os coturnos, os sapatos. A proteção aos pés, nas
marchas para as guerras, era um fator de sobrevivência. Quem tinha os
pés mais protegidos, conseguia encurtar as distâncias. Nos desertos, as
sandálias, nas montanhas nevadas, os mocassins. Em minha adolescência,
todo o cara "bacana" tinha um sapato "Passo Doble", da Vulcabrás.
Naquela época eu gostava de frequentar alfaiatarias e
sapatarias. Tinha parentes alfaiates e amigos sapateiros. Aliás, quando
eu morava no Leãozinho, na época que tinha anos, um filho de meu
padrinho, o Aristides, era sapateiro. E eu ficava entretido em ver que
as pessoas traziam seus sapatos gastos para por uma meia-sola. Em
Capinzal, os mais tradicionais, de que me lembro, eram o Betinardi e os
Zuanazzi. Adiante, na sapataria do Oneide Andrioni, em Capinzal, ele, os
irmãos Severino e Antoninho, mais seu cunhado Valdir Souza, o
Coquiarinha, tinham uma sapataria muito forte. Os fazendeiros e os
colonos traziam suas botas velhas para fazer um remonte. Agora, o Tata
Dambrós, ali ao lado da Praça Pio XII é meu "shoe assistant".
O remonte, numa bota, consistia em substituir todo "sapato"
da mesma, aproveitando-se apenas o cano do par velho. E, com uma boa
pintura, daquela tinta a pincel que só o sapateiro tinha, ficava
novinha. Meu sonho era ter uma bota, nem que fosse de remonte. Acho que
nunca tive um par delas, só botinas.
O Riciere Caldart, conhecido como "Seu Nini", era uma fera na
área, ali no Ouro. Assim como os Surdi, em Capinzal, os Andrioni, na
Linha São Paulo, os Tonini, em Novo Porto Alegre, os Frank, na Linha
Sete, o Valduga, na Barra do Leão, e outros. Todas as cidades e vilas
tinham que ter uma boa sapataria, pelo menos, e em algumas comunidades
rurais. Na verdade, nestas, além de lidar com calçados cuidavam dos
arreiames dos cavalos, das selas e dos selins. E as mulheres levavam
seus sapatos para trocar o salto, conforme a moda exigia. "Quero cortar
meu salto e por um médio!" "Quero que tire esse salto grosso e coloque
um mais alto, que tenho que ir a um casamento no sábado!"
Era tão bonito ver as mulheres com os cabelos bem arrumados, roupas elegantes, alçadas sobre belos sapatos de salto.
E os sapatos foram ganhando importância tamanha na vida das
pessoas que hoje existem de todos os tipos, de todos os materiais e para
todos os gostos. Pode-se dizer que, para a mulher, as bolsas,
igualmente, situam-se não mais como acessórios, mas sim como componente
básico da vida diária. E a combinação sapato-bolsa-cinto, quando bem
articulada, lhes atribui um elevadíssimo grau de charme e elegância. É
encantador ver uma mulher que sabe vestir-se e harmonizar suas vestes
com os seus acessórios.
E nós, homens, também fomos aprendendo com elas. Aprendemos a
combinar as cores das cintas com a dos sapatos. Às vezes, até com a
carteira. Eu, particularmente, não dispenso isso. Mas o grande consumo
em termos de calçados, hoje, é o tênis, que na minha infância chamavam
de "sneakers". As primeiras marcas mundiais foram, sucessivamente,
Reebok, Puma/Adidas e Nike. Estão há quase 100 anos protegendo e dando
conforto aos pés dos atletas.
Em termos de sapatos femininos, várias atrizes, a exemplo de
Sofia Loren, cultivaram belas coleções de sapatos. Mas, o que mais
chamou a atenção do mundo, nesse quesito, foi o que aconteceu com a
esposa do Presidente Ferdinando Marcos, hoje viúva, ditador das
Filipinas, que chegou a possuir 3.000 pares de luxuosos exemplares,
enquanto que os compatriotas filipinos passavam fome.
Ainda, bem recentemente, o investidor financeiro
norteamericano Daniel Shak teve uma baita querela na Justiça de seu país
em razão de ter descoberto que sua belíssima ex-esposa, Beth Shak,
armazenava, num apartamento, uma coleção de luxuosos1.200 pares de
sapatos, avaliada em mais de sete mil e quinhentos dólares, comprada com
dinheiro dele. A gata, jogadora profissional de poker, possui até um
blog sobre sapatos.
E você, já teve muitos pares? Então, convido a lembrar dos
primeiros calçados que lhe deram quando criança. Vale contar também
aqueles com número bem maior, para que não lhe escapassem e pudesse usar
durante pelo menos dois anos. E das congas que usou para ir ao seu
Colégio. E das bambas. E dos kichutes.
E, hoje, quando você passar pela vitrine de uma loja e
embasbacar-se com os tênis de marca, mocassins, sandálias, peep toes e
scarpins, ou quando olhar para aquele Valentino, Louis Vitton, Chanel,
Prada, Christian Loubatin, Charlotte Olympia, Dior, Arezzo e tantos
outros, e você puder comprar pelo menos um, lembre-se daqueles senhores
que um dia, no seu anonimato, ajudaram seus pés a fazer sucesso no
bailinho ou na festinha de aniversário.
Euclides Riquetti
03-02-2013