Na noite de quinta-feira, fomos surpreendidos pela notícia
do falecimento da professora, colega, vizinha e amiga Dona Holga Maria
Siviero Brancher. Ficamos entristecidos pela sua partida, que é nossa
reação lógica e primeira diante da perda de alguém que estimamos muito e
que tornou-se nossa amiga.
Nossa Dona Holga sempre foi uma pessoa muito determinada em
conquistar seus objetivos. Conheci-a ainda pequeno, pois passava
defronte nossa casa, ali no Distrito de Ouro, com suas crianças, indo
para Capinzal, a pé. Os mais velhos me diziam: "Aquela ali é da Dona
Holga, professora lá no Belisário Pena". Era uma mulher muito bonita!
Mais adiante, lembro-me de quando eu era adolescente e
estudava no Ginásio Padre Anchieta e, numa manhã, logo após nosso
recreio, escutamos seus gritos ali em sua casa, quando corria para a
rua: "Mataram o Dr. Vilson (Bordin)!" Aquilo me marcou. Foi o
acontecimento da década na pacata cidade. Eu já a conhecia bem, fui
colega de uma das filhas, Anamar, no terceiro ano primário, 1963, no
Colégio Mater Dolorum. Meu pai era amigo dela e do Seu Sady, o
marido. Depois, em 1967 e 1968, foi minha professora no Ginásio Normal
Juçá Barbosa Callado, do qual era também Diretora. Era nossa professora
de Matemática, Português e Didática. Estava grávida da Vanusa e vinha
para a Escola trabalhar com muita energia. E encontrava tempo para
deslocar-se a Passo Fundo, onde fazia seu Curso Superior. Tomava caronas
com alguns que iam para lá esduar Direito, iam de jipe, pelas estradas
poeirentas, dentre eles os Srs. Nízio Baretta e Antônio Maliska
Sobrinho.
Terminado o ginasial perdi o contato com ela, que só
restabeleci em 1977. Morávamos em Duas Pontes, município de Campos
Novos, hoje Zortéa, onde fora lecionar e trabalhar, e os assuntos
relativos à Educação eram tratados aqui em Joaçaba, na 9º UCRE. Quando
estavam implantando a Rodovia Joaçaba/Ouro/Capinzal, a Estrada da
Amizade, havia muitos atoleiros e, nos dias chuvosos tínha-se que vir
por "Linha Sete". Lembro que certa vez tive que dirigir seu Corcel no
retorno, pois estava exausta. Era de levantar de madrugada e trabalhar
até quase 11 horas da noite. E, a partir de 1978, nos tornamos colegas
na Escola Major Cipriano Rodrigues Almeida, nas Duas Pontes. Minha
antiga professora já se tornara nossa grande amiga e vizinha. Foi
pioneira em ir ao encontro da educação em nível superior.
Tinha uma concepção das coisas muito adiante dos costumes de
seu tempo. Era uma revolucionária. Buscava participar de congressos onde
quer que acontecessem. Em qualquer lugar do Brasil. Era apaixonada por
História. Para ela, não havia fronteiras. E nos dizia: "Falo demais e
às vezes me complico por isso, mas é tudo verdade. Acho que sou meio
subversiva!"...
Tinha uma forte liderança perante seus alunos. Programava
viagens e ia buscar apoio junto a empresas e ao Poder Público. Em
dezembro de 1980 levou os alunos Contadorandos da CNEC para conhecer
Florianópolis. Queria levá-los para ver os fortes, mas os eles queriam
praia! Então ela os levou para conhecer o Palácio Cruz e Souza, que era
Sede de Governo, a Praça XV, com sua imponente Figueira, a Majetosa
Ponte Hercílio Luz e a Marinha. Também as dunas brancas na Joaquina e as
finas areias do Campeche. Depois, como prêmio, a ida para Balneário
Camboriú, para conhecer a praia mais famosa do Sul do Brasil.
Recomendava que "os filhotes" não ficassem expostos ao sol, coisa de
mãezonha. Ao final, porém, todos com o couro bem vermelho! Acho que dos
mais de 40, nenhum ainda conhecia o mar. Ela proporcionava isso a eles!
Levava-os para conhecer in loco aquilo que ensinava da sala de aula,
quanto aos aspectos históricos e a paisagem natural de Santa Catarina.
Nossa vizinha, deu-nos muito apoio quando nasceram nossas
meninas, dava-nos conselhos, nos orientava, afinal criara sete
filhos. Trazia-nos roupas bonitas quando de suas viagens a São Paulo.
Organizava jantares para os alunos "do ônibus", uma vez que, morando em
Zortéa, descia algumas noites para lecionar em Capinzal. Ia e voltava no
ônibus dos alunos. Parecia uma "aluna maiorzinha" em meio aos demais.
Na Escola, uma vez, com ajuda da Miriam, fez um jantar surpresa para os
professores em dia de reunião pedagógica. Era também habilidosa
cozinheira.
Aposentada, começou a aprofundar suas pesquisas para sua
monografia de História, disciplina com a qual tinha muita afinidade, e
que lecionou a maior parte de sua vida, principalmente no Belisário Pena
e CNEC, mas também com passagens pela Sílvio Santos e Major Cipriano
Rodrigues Almeida e outras. Em razão disso, escreveu um livro sobre a
História Sócio-econômica de Capinzal. Ia às Prefeituras para ver os
registros das empresas antigas, à Agência de Estatística, à Casa da
Cultura, em Campos Novos, às Exatorias e Coletorias das cidades gêmeas e
daquela.
O lançamento de seu livro aconteceu no Centro Educacional
Prefeito Celso Farina, com cerimônia presidida pelo amigo Ademir Pedro
Belotto. Lembro bem que ele falou daquilo que realiza o Ser Humano: "Ter
filhos, Plantar uma Árvore e Escrever um Livro". E ela estava cumprindo
isso! Foi um evento muito concorrido. Deixou uma marca importantíssima
com isso. É uma ótima referência bibliográfica de nossa História.
Autografou-me um exemplar.
Há uma década nos encontramos em Toledo, no Paraná, na Festa
da Família Durigon, lá realizada. Lá moravam a Ana Leonor e o filho
Cássio. Foi, para nós, uma grande surpresa tê-la reencontrado. Depois
disso, avistei-a apenas mais uma vez, em Capinzal. Passamo-nos alguns
recados pelo facebook e, para nossa surpresa, a notítica de sua partida.
Imaginamos que pessoas que nos foram caras um dia devessem ser eternas.
Uma pessoa muito adiante dos costumes de seu tempo, porque
ousava buscar o conhecimento, mrgulhar no desconhecido, sem medo. Isso
num tempo em que as mulheres, em sua maioria, ainda não trabalhavam
fora. Foi mãe de sete filhos e os encaminhou todos para frequentarem as
universidades, fato que pode ser considerado quase que exceção à regra
geral, uma vez que poucas famílias conseguiam fazer isso. Criou, com
muito amor, respeito e exemplo, todos os seus, e fez muito pelos filhos
dos outros. Ana Leonor, Anamar, Ana Lice, Antônio João, Maurício,
Cássio e Vanusa podem orgulhar-se da mãe que tiveram. Falar de seus
filhos era seu maior orgulho. Minha esposa sabe o nome deles e as suas
características pelo que a Dona Holga os descrevia em suas falas.
A manifestação de seus ex-alunos nas redes sociais atesta o
quanto foi querida por todos. Quando tivesse que tomar partido em uma
situação, ficava ao lado do aluno, o que lhe deu credibilidade e
confiança perante ele. Ter sido seu aluno, colega, vizinho e amigo foi
um grande privilégio. Fica sua imagem eternizada no pensamento de cada
um de nós. Esteja feliz num lugar muito bonito mrecido, Dona Holga!
Euclides Riquetti
25-05-2013