Como preservar uma amizade de meio século? Tenho certeza de que você, leitor (a) madurão (ona), que já está pré-idoso, tem muitas amizades assim. São aquelas de que nunca nos esquecemos, aquelas que ficaram internalizadas em nós e que, mesmo que não estejam constantemente alimentadas, estão guardadas no fundo de nosso coração. Uma amizade verdadeira, mesmo que seja em alguns momentos abalada por percalços, a esses sobrevive quando ela é autêntica, não surgiu como fruto de algum interesse.
Resgatar amizades tem sido meu afazer favorito neste novo ano. E como me sinto contente em poder fazer isso, ter tempo disponível para tal! E uma arma fortíssima a me apoiar é o Mr. Google! Esse cidadão merece meu reconhecimento e meu aplauso, pois me tem possibilitado chegar a endereços que eu jamais imaginei que pudesse. E, nesses endereços eletrônicos, quantos amigos já revi! Que felicidade, quanta alegria isso já me trouxe!!!
Simples recados, uma mensagem curta enviada e uma resposta obtida, por mais sintética que seja, sempre nos reaproxima de alguém que queiramos. Não sei como que se operam as artimanhas da comunicação digital, mas, por alguma razão, recebo solicitações de amizade. Aceito todas, porque sempre que algum pede minha amizade, o mínimo que posso fazer é retribuir aceitando. E, de minha parte, procuro buscar pessoas com quem algum dia convivi, mais antiga ou mais recentemente. Quando envio uma solicitação é porque alguma razão me diz que é uma pessoa confiável e que merece minha amizade. Ou porque algo me diz que é uma pessoa confiável e de quem posso aprender algo novo.
Nesta semana, reencontrei um amigo que, desde 1965, quando saiu ali do Ouro para Araruna, no Paraná, eu só o vi uma vez, há quase 30 anos: Severino Mário Thomazoni. Éramos vizinhos, moradores da Rua da Cadeia naquela época. Fundamos um time de futebol, entre vizinhos, nenhum distante mais de que 1 Km da Cadeia. Todos pessoas humildes, que gostavam de jogar bola nos campinhos. Em 13 de dezembro de 1964 fundamos o Palmeirinhas. E nosso campinho, justamente, ficava ao lado da cadeia. Primeiro, no próprio terreno desta. Depois, com a sua construção, foi deslocado um pouquinho ao lado.
Tínhamos uma sede, numa sala no porão da casa do Sr. José Thomazoni, junto à sua fábrica de vassouras. Passamos a jogar no Campo de Futebol Municipal, em Capinzal, que pertencia à Rede Ferroviária. Obtínhamos muitas vitórias jogando nas comunidades rurais. Tínhamos jogadores habilidosos. Nosso principal rival era o Juvenil do Grêmio Esportivo São José. Tínhamos jogadores da mesma faixa de idade. Em Capinzal havia o Botafoguinho, de jovens. Os aspirantes deles tinham idade compatível com a nossa. Os times existiram enquanto as pessoas estavam por lá. Ficando adultos, foram jogar para outros e os times sumiram. Muitos foram estudar fora e isso prejudicou nosso futebol. Eu fui para o juvenil do Arabutã, depois para Porto União. Lá foram anos de estudo e bola só am brincadeiras.
Na segunda-feira, 04, depois de contato via facebook, liguei para o cellular do Mário. Grande surpresa teve ele. E muita alegria tivemos. Falamos mais de duas horas, entramos na madrugada. Quantas belas lembranças, ele me perguntando sobre as pessoas daqui e eu perguntando sobre seus pais, que faleceram, sua irmã Nina e o irmão Arlindo. Falamos de família, de esposas, de filhos, de netos. Que alegria!
Lembrei-o de uma vez que fomos tarrafear, à noite, ali abaixo da barragem do Rio do Peixe, no lugar que chamávamos de "ladrão" de água. Acendemos um fogo ao lado de uma corrente de água para clarear e os lambaris saíam do rio e se metiam no meio das pedrinhas por onde escorria um pouco de água. Nós os pegávamos com as mãos, enchíamos as sacolas. Diz que quando conta isso em Araruna falam que é "conversa de pescador". Mas é pura verdade.
Lembrei-o de que quando saímos para casa, altas horas da noite, ao passar por sobre uma árvore tombada no valo, que servia de ponte de passagem, ele caiu na água. Estava com casaco, de "conga" e com uma sacoleta pendurada com a tarrafa dentro. De um ímpeto, muito ágil, o Ademir Miqueloto (falecido em Porto Alegre), atirou-se na água e o salvou. Coisa para nunca mais se esquecer. E ele foi dando-me deltalhes sobre isso...Foi um susto para nós.
Nossa sessão saudosista terminou quando ele me passou as fotos dos times antigos, de 1964 e 1965, de Capinzal e Ouro: Do nosso Palmeirinhas (da Rua da Cadeia), do Botafoguinho (de Capinzal), do Arabutã e do Vasco. Ver essas fotos me dá uma nostalgia dolorosa, pois verifico que muitos dos viventes da época já foram pro céu...
Como não é meu propósito publicar fotos no blog, as que ele mandou estão no meu facebook, quem quiser vê-las, busque por lá e sintam-se à vontade para compartilhar. Ele, inclusive, descreveu os nomes dos atletas e dirigentes. Tem tudo bem organizado, coisa de quem gosta muito de futebol.
Uma das fotos, de dezembro de 1964, traz os seguintes atletas: Ivanir Souza (Coquiara), Ironi Riquetti (o Foguete, falecido), Cosme Richetti (Joaçaba), Djair Pecinatto (Lages?), Juventino Vergani (Bicicleta ou Bichacreta, Água Doce/Joaçaba), Romário de Vargas (Caçador), Nereu de Oliveira (Curitiba), Moacir Richetti (Joaçaba), Ademar Miqueloto(Ouro), Altevir Souza (Joaçaba) Valdir Souza (Joaçaba), Luiz Alberto Dambrós, (o Tratorzinho, Goiás), Severino Mário Thomazoni (Araruna-PR), e Euclides (Pisca) Riquetti (Joaçaba). Nós arrumamos umas camisetas brancas, regatinhas, cada um, e tingimos de verde. Bordamos um "P" do Palmeiras com ponto corrente. Fizemos isso tudo nós mesmos. Foi o único jeito de termos uniforme. E quem não tinha chuteira, jogava de conga ou descalço. Foi nosso primeiro time.
Uma segunda foto, mostra nosso time já evoluído, tínhamos A e B. Incorporamos o Fluminense do Rogériol Caldart e ficamos com a seguinte formação: Rogério Caldart, Sílvio Dorini, Arli Silva, Vicente Gramázzio, Rubens Flâmia, Severino Mário Thomazoni, Paulo Zuanazzi, Sérgio Baratieri, Valdir Souza, Altevir Souza, Dejair Pecinatto e o mascote Cleverson Richetti, que faleceu 15 dias antes de completar 18 anos, em 1976. O time usou a camisa do Fluminense.
Uma terceira, da inauguração de um jogo de camisas mangas longas, brancas, teve: Nereu de Oliveira, Antônio Gramázzio (Pítias), Vicente Gramázzio, Romário Vargas, Severino Mário Thomazoni, Nilton Segalin, Ricardo Baratieri, Antoninho Carletto, Valdir Souza e Djair Pecinatto. O Ricardo Baratieri atuou no lugar do Celito (Bandito) Baretta, que entrou depois. Foi a única partida do Ricardo. Quando se substituía um jogador, este pagava a camisa do que estava em campo, pois não tínhamos camisa de reservas...
Fico contente em poder, junto com o Mário Thomazoni, resgatar um pouco de nossas histórias. Foram tempos em que, para comprar uma bola, fizemos uma rifa americana de um Ferro Elétrico, vejam bem. E era o único jeito de democratizar o futebol, pois se aceitássemos jogar com a bola de alguém, esse iria querer ser titular e jogar tempo todo. Então, melhor do que aceitar isso, era vender os números da rifa do ferro elétrico...
Euclides Riquetti
06 de março de 2013