Por ter nascido e morado na colônia tive estreita ligação
com a roça desde meus tenros anos. Dos meus 4 aos 8, já ajudava a
cuidar dos animais na propriedade de meu padrinho, João Frank , no
Leãozinho. Bem cedinho, 5 horas, já estávamos de pé, nas frias
madrugadas de julho. Café com leite e pão com mel era comida de
crianças. Os adultos tomavam café preto com grappa (graspa, como dizem
aqui), para esquentar. Antes de o dia clarear, estávamos com os bois
atrelados à canga e andando em círculo ao redor do "torcho", o Engenho
com três cilindros e engrenagens de madeira, para moer a cana. E, minha
função, era a de puxar os bois. Ia à frente deles, com uma corda, a
ligeira, madrinhando-os. Depois que eles se adaptavam à rotina, a corda
era jogada para trás e era só ficar segurando-a que eles iam à frente,
fazendo seu trabalho. Quando clareava, a cana já se transformara em
caldo, a guarapa.
Uma parte da guarapa ia para o tacho retangular, colocado sobre
umas pedras, para se fazer o açúcar amarelo. Só na idade adulta vim a
saber que o tal de açúcar mascavo era o açúcar amarelo. Eu imaginava que
o mascavo, pelo nome, devia ser fabricado somente em Portugal. Era
assim meu desconhecimento e minha ingenuidade... Sob o tacho, fogo
lento, brando, e as moças mais jovens, Catarina e Delcia, cada uma com
uma pá de madeira, tipo espátula, para vir mexendo o líquido, evitando
que a fervura o fizesse transbordar. Era uma tarefa que levava umas duas
horas. Ao final, se o açúcar saía "quase branco", era a glória. Porém,
se a cana tivesse tomado muita geada, sairia mais escuro.
O padrinho orientando tudo, dando as ordens. E levando guarapa
para o alambique para fazer cachaça. O Estefano, que já buscara
os bois, ia colocando a cana para moer. O Aristides ajudava. A
madrinha Raquel e a filha mais velha, Alaídes, tiravam o leite das
vacas e punham coalhar para fazer o queijo que iriam vender na cidade,
para o comércio do Adelino Casara, do Alcides Zuanazzi, do Jacob
Maestri ou do Severino Baretta. O Estefnito cuidava de apetrechar os
bois e eu, faceiro, ia tocando-os. Todos trabalhávamos. Eram assim as
famílias de origem italiana. Trabalhavam, rezavam antes das refeições.
Na quaresma havia terço todas as noites, as famílias iam em rodízio, de
casa em casa. Depois, um mate doce e pipocas "melecadas". Melecadas eram
aquelas que até hoje fazem aqui em casa, e que a turma adora, com o
"açúcar amarelo" quente, deretido, dando-lhes inigualável sabor.
Depois de tudo encaminhado, o Estefenito pegava a carroça e me
punha em cima. Os bois iam sob o seu comando de voz e da corda.
Subíamos o morro para buscar o milho, em final de colheita, onde
ainda havia umas cargas já quebradas e cobertas com uma lona velha. Ele
ia cantando: "O Sílvio Biarzi tem três filhas pra casar/Uma delas é a
Irlandina/Aquela mesma eu vou buscar"!. E eu ia cantando junto. Ele era
apaixonado pela moça que morava em Linha Vitória, do outro lado do morro
das terras deles...
Hoje, 55 anos depois, está lá ele, casado com a sua musa
inspiradora, a Irlandina, e com os filhos e netos, morando na Linha
Sete, grisalho e participando de todas as festas e bailes da Terceira
Idade do Baixo Vale do Rio do Peixe. Brinco muito sobre isso com eles
quando os encontro! E, encontrá-los, me remete à infância, a muitas e
agradáveis lembranças. E, como diz o amigo Adelto Miquelotto, Agrônomo
da Cidasc: "Como o amor é lindo"!!!
Euclides Riquetti
03-01-2013