Maria Lúcia Sartori (de Lima) e Lourenço
Na segunda metade da década de 1960 o Lourenço de Lima era aluno do antigo Ginásio Normal Juçá Barbosa Callado, um curso que funcionava à noite, nas dependências do então Grupo Escolar Belisário Penna, em Capinzal. Era vinculado à Rede Estadual de Ensino de Santa Catariana. Eu estava em uma série acima da dele, e tínhamos como uniforme, no Sete de Setembro, calças de tergal de cor verde-garrafa, com camisa branca. O seu apelido (todos tínhamos naquela época), era "Neto", porque era neto do Sr. Nicola, um dos pioneiros do Bairro Parque e Jardim Ouro, que era quem cuidava na manutenção do estádio do Arabutã Futebol Clube, recém construído. O gramado era primoroso, o campo tinha as dimensões de 120 x 90 metros, as mesmas medidas do Maracanã naquela época. Seu Nicola e os netos Lourenço e Isaías Bonato foram primorosos nos cuidados do estádio da Baixada Rubra. Aliás, dois jogos importantes aconteceram na época, no Estádio da Baixada Rubra: O primeiro, inaugural, contra o Perdigão, de Videira, campeão estadual. Depois, numa tarde de dia se semana, o São Cristóvão, do Rio de Janeiro, que na época era um clube respeitado no Rio de Janeiro. Os ensinamentos do avô Nicola foram muito úteis para toda a vida do "Neto".
O Lourenço veio do Barro Preto (Capinzal), para morar com seu avô, em Ouro. Ia para a escola à noite e de dia o ajudava em suas lides. Na antiga Rua São Paulo, atualmente denominada de Pedro Bernardi, lá ia o Seu Nicola com o Lourenço, vestindo bombachas, chapéu, botas e um enorme palheiro na boca, para os rumos do campo de futebol do Arabutã. O palheiro era um cigarro artesanal, confeccionado em palha de milho e com o interior recheado em fumo picado, devidamente cortado do produto em corda, que era conhecido como "fumo crioulo". Alguns chamavam-no de "fumo macaio". O avô era um cidadão de cultura cabocla, ali da região do Barro Preto, em Capinzal, com fala mansa e pausada. O Neto não era muito diferente, só que era um rapaz romântico. Foi essa a característica que encantou a sua amada, Maria Lúcia, com quem se casou e teve um descendência honrada, onde a educação, a inteligência e as virtudes de todos compõem a principal característica.
A pé, ou mesmo de bicicleta, o Lourenço vinha da antiga SIAP (Sociedade Industrial Agropecuária), até a cidade na época da emancipação de Ouro, abrindo portões que se situavam na estrada a partir da propriedade de Benjamim Miqueloto e passando pela de Aldecir Campioni, em chão batido. Nas proximidades da "cadeia pública", havia uma cancela (portão), para que os veículos não entrassem ou saíssem da cidade em dias de chuva, para não ficarem atolados nas estradas rurais. A Rua Governador Jorge Lacerda - Felip Schmidt, tinha a pavimentação, com paralelepípedos de basalto, apenas até onde se localiza a residência do saudoso Jardino Viel e Dona Apolônia.
Neto acompanhava o avô que vinha para a cidade negociar e era freguês do Clarimundo Bazzi, que tinha um armazém de secos e molhados, a empresa Totti, Bazzi e Cia. Ltda. Ali compravam os mantimentos e um pedaço de fumo em corda, uns duzentos gramas, para a confecção dos palheiros.
Pouco tempo depois, o Isaías Bonato, primo dele, veio morar com seu Nicola e passaram a dividir a ajuda aos nonos. Isaías ficou sendo chamado de Netinho e, com o Lourenço já trabalhando, era ele que passou a acompanhar o velho nas compras. Muitas vezes vinha sozinho e menino que trazia nas costas um saco branco de algodão, alvejado, ´para carregar as compras. Sabia de cor o que tinha que comprar.
O Lourenço começou a trabalhar fora, inclusive trabalhando na antiga Rádio Clube de Capinzal, que funcionava em Ouro, no andar de cima da Tipografia Capinzal, ali defronte ao Seminário Nossa Senhora dos Navegantes. O Neto fazia uns programas de música caipira, incluindo umas modas gaúchas, na década de 1970 e início da de 1980. Era o sertanejo raiz e, nas gaúchas, Teixeirinha, Meri Terezinha (companheira dele), e José Mendes, com seu !"Para Pedro" e "Não aperta Aparício". Nas sertanejas o Lourenço tocava muito Tonico e Tinoco, Mário Zan, Pedro Bento e Zé da Estrada, Milionário e José Rico, e outros da época. Lembro bem da voz dele e da maneira como se expressava, fazendo propaganda das rações Purina. Nos recados, dizia:"Purina avisa que tem pintos de um dia a preço de..." . Uma prima dele e uma amiga dela, ambas muito sapecas, que eram minhas alunas na Escola Prefeito Sílvio Santos, davam uma emendada nas expressões e riam.
Não havia muitas propagandas gravadas naqueles tempos. Lembro bem daquela das casas Pernambucanas, que forneciam a eles o disco compacto de vinil com aquele musiquinha: "Não adianta bater, que eu não deixo o frio entrar, as Casas Pernambucanas, é que vão aquecer o meu lar. Vou comprar flanelas, lãs e cobertores eu vou comprar, e não vou permitir, o inverno passar".
Quando voltei a morar em Ouro, tive muitas conversas com ele, pois fui professor de seus filhos. Era uma pessoa de boa conversa, embora reservado. Imagino que devesse ter muitas anotações, muitos registros importantes. Lembro que ele portava um caderno onde escrevia letras de músicas que compunha no dedilhar das cordas de seu violão. Deve ter muito material precioso guardado que eu muito gostaria de ler!
Adiante, ele trabalhou na Marcenaria e Carpintaria São José, em Ouro. Também na empresa da Família D ´Agnoluzzo, em Capinzal. Era um marceneiro e moveleiro habilidoso. Trabalhou também por conta própria, no mesmo ramo. Depois que ele foi morar em Capinzal, perdi o contato com ele. Morou, nos últimos anos de sua vida, em Capinzal. Posso asseverar que seu maior amigo em vida foi o Pedro Casemiro Zaleski, da Marcenaria e Carpintaria São José. Na empresa, Lourenço foi um marceneiro formidável, um artista na arte de produção de móveis e esquadrias de madeiras.
O "Neto" foi casado com a Maria Lúcia (Sartori), tão amiga minha quanto ele. O casal teve como filhos Luciana Rita, que é mãe de Pedro Augusto de Lima Belotto; Lucimar Cristina; Lucitânia Aparecida, que é mãe de Luiz Felipe Baptista e Thiffani Bruna; Loureço Júnior, que nasceu gêmeo com Luciano Alencar, este falecido aos 46 dias de vida; Maurício Ricardo (falecido aos 39 anos, em 02 de fevereiro de 2018; Thiago Antônio; e Vinícius Augusto.
Numa época da vida as coisas não estavam muito bem e viveu uns tempos longe de sua esposa. Mas, depois, acabou se reconciliando com ela e isso foi um ato que envolveu com muita alegria seus filhos e netos. Quando a Lucimar me falou que eles passaram "os últimos tempos" reconciliados, cheguei a me emocionar. Seus últimos meses, passou mais tempo internado em hospital do que em casa, mas sempre foi muito amado por seus familiares. O amor de Lourenço e Maria Lúcia foi abençoado por Deus e, agora, pelos filhos e netos!
Fiquei muito triste com sua partida, e a forma que tenho de homenagear a ele e os caríssimos entes é deixar aqui registrado que ele foi um homem de valor, um profissional talentoso e um artista muito sentimental. Sempre sentiremos saudades do amigão "Neto"!
Euclides Riquetti e Família
24-05-2024