Ricardo - Lurdes - Taíse - Marieli
Era uma tarde quente, pleno veranico de maio - 24 de maio de 1991 três décadas atrás. Eu estava em meu gabinete de Prefeito Municipal, em Ouro, quando entrou uma ligação do amigo e ex-aluno Ivan Fernande Vitorazzi. A notícia que chegava era trágica: um acidente de trabalho, tirara a vida de um amigo em comum, Otavino Cesca, morador de Serra Alta, Ouro, poucos quilometros da sede do distrito de Santa Lúcia.E, além do baque sentido, havia uma missão árdua a cumprir: avisar a filha de Otavino, Ivone, casada com Pedro Casagrande, morador dos altos da Rua Presidente Kennedy, de que seu amado pai falecera! Estava afiando uma ferramenta, quando a pedra de afiar de um esmeril movido a motor elétrico espatifou-se com o atrito, e foi atingir o coração do amigo:uma explosão fatal!
Avisei meus colaboradores imediatos, tomei o rumo da casa do Pedro, filho do Ferdinando Casagranda. Uns três minutos e eu estava lá. Estacionei a Parati preta na estradinha de entrada, fui-me achegando, a Ivone me atendeu, disse-lhe que precisava falar com o marido dela, o Pedro. Ela estava grávida (do filho Ricardo) e eu não sabia como lhe relatar. Conduziu-me até o chiquierão, onde ele lidava com os animais ali alojados. Cumprimentei-o, fui inventando conversas, perguntando sobre o plantel de suínos, queria falar com ele a sós. Eu me movimetava de um lado para outro, tentava lhe fazer sinais de que eu queria lhe passar um recado muito triste, ele não percebia. Mas a Ivone parecia sentir que algo havia acontecido, eu não era de ficar enrolando, eu costumava ir direto ao assunto quando tinha algo a dizer aos meus minícipes.
Imagino que tenham sido mais de dez minutos de tentativas de afastá-lo dela, sem sucesso. Então, decido-me por abrir o jogo, falar-lhes sobre o que tinha acontecido, mas faltava-me a coragem, pois entendia que o impacto sobre a filha do Otavino seria muito grande. Mas falei: - "Recebi um telefonema do Ivan Vitorazzi e ele me disse que aconteceu um acidente com o Otavino e que era para subirem até a propriedade deles na Serra Alta. Preparem-se que eu mesmo levo vocês até lá!" Expliquei sobre a explosão da pedra do esmeril, que atingira o peito do pai dela. Não falaram mais nada, apressaram-se e logo estávamos na estrada. Eu puxava assuntos diversos, o Pedro conversava comigo e a Ivone calada. Entendera que, se ele tivesse sobrevivido, estaria no hospital e não em casa...
Lembro-me de que um dos assuntos que entabulei foi o de que eu vendera um Chevette para o Cesca, recebera três vacas no negócio, uma Gir, uma Holandesa e uma Jérsey, mais um dinheiro. O Jardino Viel fora procurado por eles, que queriam um carro, e veio em minha casa ver se eu tinha interesse em vender, fomos na fazenda, conversamos com o Otavino e seu filho, e eu aceitei a proposta dele. Não precisávamos de nenhum contrato, pois ele era um homem bem sucedido e honrado, merecedor de toda aconfiança. Na época em que poucas pessoas se preocupavam em preservar a natureza, ele possuía reservas florestais nativas e reflorestamentos com pinus e eucaliptus, além de lago grande para criação de peixes. Trator novo no galpão, todos os implementos agrícolas de que precisava, tudo muito organizado. Eu ia imaginando um jeito de manter a conversa com o Pedro e via, pelo retrovisor, que ela estava calada....
Depois lhes falei que estivera algumas vezes na casa de seus pais. Na minha campanha a Prefeito, em 1988, comi pão com mel oferecido pela Dona Lurdes. Uma fatia grande, pão feito em forma grande, forno colonial. Café com leite generoso, adoçado com açúcar mascavo... De outra feita, jantei lá com o Deputado Estadual Zezo Pedroso, que buscava sua reeleição, projeto em que foi exitoso. Pedroso era grande agropecuarista com fazenda em Erval Velho, cooperatisvista, e muito amigo de Cesca. Na estrada, ele me dissera que o Otavino era o líder cooperativista mais qualificado de nossa região, era respeitado pelos seus liderados, uma pesssoa séria e honesta, com muita credibilidade. Eu comungava do mesmo pensamento que o Deputado, pois bem conhecia o Otavino Cesca, forte e organizado produtor. Milho, soja, trigo, feijão, erva-mate, pastagens e toda a sorte de animais povoavam sua propriedade.
Seguimos por Nossa Senhora da Saúde, Novo Porto Alegre, Leãozinho e chegamos perto da Capela da Serra Alta, ali onde hoje se situa a Associação Nova Concórdia, sede da Academia para a Ciência Futura. Na encruzilhada, tomamos a esquerda, passamos pelo campo de futebol, pela propriedade do Frigo e chegamos à casa, onde lá estava a esposa de Otavino, Dona Lurdes (Simioni), e filho Tranquilo, que chamavam de Níni. O desespero tomou conta da Ivone, que abraçou seus familiares. Havia já, lá, dezenas de carros de pessoas conhecidas. No dia seguinte, o sepultamento, a tristeza e o luto presentes na família, nos vizinhos e nas redondezas.
Os filhos de Ivone e Pedro, Taíse, Ricardo e Marieli são o orgulho da família. Pedro e Ivone moram na mesma propriedade, agora já rodeada pelos novos loteamentos implantados, mas sem perder as características convencionais dos Casagranda/Casagrande.
Recentemente, encontrei Dona Ivone e o Pedro no Marcado RA Masson, em Ouro. Todos de máscara, não os reconheci, inicialmente. Ela me reconheceu pela voz, disse-me quem era, o Pedro veio e participou, relembramos um pouco daquela data trágica: 24 de maio de 1991. Era meu terceiro ano de meu mandato de prefeito. Acho que foi a tarefa mais difícil, a situação mais difícil que tive que enfrentar. Hoje, guardo saudosamente as lembranças com carinho, tenho apreço por todos eles.
E, em minha mente, volta-me a imagem daquele senhor, magro, alto, olhos azuis que pareciam duas pérolas, cabelos iniciando um leve prateado, uma pessoa generosa e de grande coração. Emociono-me em lembrar dele, uma grande homem, um bom esposo e exemplar pai de família, Que seu nome fique, através de minha crônica, gravado para a História. É o mínimo que posso fazer por ele!
Euclides Riquetti
27-01-2022
Emocionante demais, gratidão Euclides, pelo carinho e por contar essa história, que para nossa família tem muito significado e sentimento. Apesar de não ter conhecido meu avô Otavino, sinto muito orgulho pelo homem que foi e história que construiu, tenho certeza que deixou marcas e exemplos positivos para muitas pessoas.
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