domingo, 17 de dezembro de 2023

Papai Noel Existe - eu acreditei! Crônica de memórias de minha infância



         Saí de casa com apenas 1 ano e 47 dias. Não fui doado, fui carinhosamente levado pela minha madrinha, Raquel Vitorazzi Frank,  para morar com a família dela, em Leãozinho. Nascera minha irmã, Iradi, que teve por segundo nome Lourdes, pois morávamos a 100 metros de uma gruta dessa Santa, no Distrito de Ouro, então município de Capinzal. Naquele dia 09 de janeiro de 1954,  meu destino começou a se moldar. E moldou-se da forma que uma criança não quer, porque embora muito amado na casa onde vivi minha infância, eu tinha muitas saudades de meus pais.  E de meu irmão, Ironi, 5 anos mais velho que do que eu.  Acho que é por isso que sempre quis ter meus filhos perto de mim. (Agora  já mudei minha opinião sobre isso, acho que não importa onde eles estejam, mesmo longe, o importante é que estejam bem, tenham saúde, vivam bem). Senti muitíssimo quando eles foram tomando rumo próprio na vida. Agora estou feliz com isso, porque não foi uma ruptura, foi um ausentar-se "soft", eles sempre estão por perto...

          Minha ligação era  forte com a família, mesmo  morando fora. E, agora, nesses dias em que a sensibilidade se aguça, lembramos... Quem de nós, leitor (a), não lembra dos natais da infância, das expectativas sobre os presentes, as comemorações em família, muita comida boa, comer chocolate sem culpa, vestir-se com roupa nova, dos tempos em que o Papai Noel existia?

          Bem pequeno, me contavam aquelas histórias bonitas sobre o Bom Velhinho. E lá, na colônia, num método pedagogicamente involuntário, me educavam para acreditar, adaptavam a história aos seus costumes. O Bondoso não vinha em trenó com renas. Vinha montado a um burrinho, entrava pela janela à meia-noite, por isso tínhamos que ir dormir cedo e deixar as janelas abertas. Ele tinha um saco com presentes e deixava um para cada criança, tornava-nos muito felizes. E minha função, na véspera, era colher uns pastos e deixar num cochinho de madeira, um daqueles que eram usados para dar comida aos terneiros, para que o cansado burrinho, que viera do céu, pudesse reabastecer-se de energias e ir levar os presentes para as crianças da vizinhança.

          Para mim, essa figura lendária, adorável, bondosa, povoou minha mente fantasiosa até o Natal em que eu já tinha  três anos.   Eu estava na expectativa de ir buscar o pasto, arrumar direitinho no cochinho, (e também uma tigela de madeira com água, não esquecer de   deixar a janela aberta. Eu dormia no quarto de meus padrinhos, tinham uma "cuna" para mim, eu deitava e eles contavam-me histórias para que eu dormisse. E, naquela noite, 24 de dezembro de 1955, eu estava a fim de ver a chegada do velhinho, ver como ele era, como se vestia. Sabia que tinha barba branca, roupa vermelha, botas pretas. Mas não havia as imagens que hoje temos abundantemente nas mídias, nas vitrines das lojas, nos cartões, e até mesmo o Papai Noel que está na loja ou no shopping, pra que todo mundo veja.

          Minha ansiedade era muita, meu padrinho percebeu isso, e lascou: "Papai Noel não existe, vou te mostrar"! E pegou um pacote de cima do guarda-roupa, que meus pais haviam mandado,  em que estavam  meus presentes: um papai noel de chocolate, um reloginho de chocolate, balas, e uma blusinha  verde com listas horizontais brancas. Minha madrinha foi à loucura, brigou com ele, não deveria ter feito isso! Vieram a Alaídes (Ladires), a  Catarina e a Delcia e diziam-me que o Padrinho estava mentindo, que o Papai Noel havia mandado os presentes, que ele viria depois para me entregar...  E foi muita confusão na minha cabeça. Na verdade, eu queria que Papai Noel existisse. Aquele velhinho,  produto da tradição, tinha que ser real! Não poderiam todas as historinhas que ouvi sobre ele serem mentira...

          Nos natais seguintes continuei a ganhar presentes. E continuei  a deixar um prato sobre a mesa da sala, um papelzinho com o nome, para que os presentes fossem colocados dentro. Aos oito anos, quando fui morar com meus pais na cidade, e conhecer as figuras de Noel nas revistas, comecei a me perguntar e estabelecer algumas verdades sobre as coisas: "Por que ele usa aquelas roupas de frio se é sempre muito calor no Natal? Se ele vem pela chaminé da lareira, então vai só nas casas onde tem lareira. Não tem como ele descer pelo cano de zinco do fogão. Aquela barba é de verdade ou é barba de árvore? E aquele Papai Noel das Casas Pernambucanas, que o Donato Pacheco leva nas casas para entregar presentes, é de verdade? E por que muitos amigos ganham bicicletas, revólveres de espoletas com rolo, bolas, até chuteiras, e nós só ganhamos roupinhas"? Mesmo assim, fiquei esperando pelos presentes do Bom Velhinho até 11, 12 anos. E propagando a fantasia para meus irmãos pequenos.

          Ah, como é bom o mundo da fantasia!!! Como é bom esquecer tudo e viver apenas para o que nos deixa feliz, sonhar...

          Aprendi a sonhar. E dividir meus sonhos com os outros. Amarrar um Papai Noel no telhadinho defronte à  janela de meu quarto, outro na da sala, colocar luzes coloridas na varanda, na cerca, nas árvores. deixar-me levar pelos sonhos. O sonho é real, enseja possibilidades que a vida muitas vezes não oferece. Sonhar me deixa feliz. sonhar e poder dizer pata todos os amigos: FELIZ NATAL!

Euclides Riquetti
24-12-2012

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