segunda-feira, 20 de julho de 2020

A questão Coimbrã – o elogio mútuo e a rasgação de sedas


Questão Coimbrã | Toluna


       Pessoas que fazem parte de um determinado grupo social ou profissional precisam pautar-se, em suas manifestações, pela ética e pelo bom-senso. O falar polido e elegante não faz mal pra ninguém, é coisa para gente educada. Porém, muitas vezes, a fala entre grupos pode tornar-se ridícula, quando há a presença do narcisismo coletivo, se é que a expressão possa ser usada para indicar o que eu quero dizer. No meio televisivo, isso é muito presente.  É crítica contra todo mundo, e nada de autocrítica. Parecem semideuses que entendem de tudo, mas que fazem afirmações muitas vezes sem terem nenhuma certeza do que dizem, vão na toada do momento. Traduzindo: Jornalistas que fazem parte dos quadros de canais de notícias que dizem informar seus assinantes durante as 24 horas do dia, aos telespectadores que pagam para vê-los, em vez de informar melhor, repetem ou requentam os assuntos, fazem uso de práticas, além de apologia à fofocas, ao elogio mútuo. Isso é coisa muito antiga, que já teve reparos dentre os falantes de nossa Língua Mater, nossa “Flor do Lácio”, desde a segunda metade do Século XIX, em Portugal. Os meios mudaram, mas os métodos continuam os mesmos!
       Em 1865, em Portugal, o poeta romântico Pinheiro Chagas publicou “Poema da Mocidade”, o qual foi contemplado com um posfácio extremamente elogioso, de outro poeta do mesmo gênero, Antônio Feliciano de Castilho. Ao mesmo tempo, Castilho alfinetava uma nova geração de poetas que estava surgindo, que integravam a “Escola de Coimbra”, aquela “Geração de 70”, de estudantes de Coimbra, mais realistas e naturalistas do que românticos. Ideias novas, modernas, eu diria progressistas. Feliciano de Castilho escreveu que os jovens poetas tentavam “subverter a noção de poesia e de falta de bom senso e de bom gosto”. Castilho ficou mais conhecido pelo apadrinhamento a outros escritores do que pelas suas obras medíocres.  Um desses novatos, Antero de Quental, contrapôs-se a Castilho, que os conhecedores de literatura sabem que foi um poeta medíocre.
       Quental escreveu, como resposta, a “Escola do Elogio Mútuo”, em que criticava Castilho e seus seguidores, pois este enaltecia os poetas mais conservadores e estes lhe retribuíam elogios. Na verdade, isso foi uma coisa muito vergonhosa que aconteceu na história da literatura de nossa Língua. Era só bajulação e elogios entre si! Esse episódio é conhecido como a “Questão Coimbrã”. A mesma prática veio se propagando através dos tempos e está muito presente entre os comentaristas das emissoras de televisão. É só prestar atenção na rasgação de seda entre eles: um elogia o penteado ou o corte do cabelo do outro (ou outra), a cor da gravata, o modelo do paletó, o corte do traje, a cor da blusinha, uma foto que foi por um deles postada numa rede social, e assim por diante. Isso foge muito do que seja jornalismo...
       Por outro lado, estão prontos a criticar seus alvos ou proteger seus queridos. Já bajularam Fernando Henrique Cardoso e Lula, depois defenestraram este último, e sua sucessora Dilma Rousseff.  Dividiram-se na proteção ou na crítica a Michel Temer e, agora, mostram os defeitos de Jair Bolsonaro. São os donos da verdade, todos muito auto-suficientes, principalmente os que integram as emissoras Globonews, CNN News e a Globo aberta. Outros canais, emissoras de transmissão aberta, por sua vez, bajulam o Poder e os poderosos. Uma prática que também pode ser desprezada. E, mesmo pregando o distanciamento social, ficam lá, muitas vezes recostados um no outro, nem meio metro de distância, uma elogiando os brincos da outra, arrogância presente, uma coisa muito feia e desprezível.
       Com o Presidente Bolsonaro tendo que se resguardar em razão da Covid 19, parece que ele se acalmou um pouquinho, deve estar refletindo sobre sua conduta de comunicação inadequada e de comportamento pessoal diante da pandemia. E, quando há um consenso de que todos precisam atuar de forma homogênea, lá vem o Senhor Gilmar, o GM, a falar das Forças Armadas Brasileiras dando-lhes uma conotação de genocidas. Devia ter ficado quieto, a função dele e de seus pares deveria ser a de julgar se os atos das pessoas e dos governos estão dentro dos parâmetros da Constituição Brasileira. No STF, também a bajulação entre os ministros é muito frequente quando proferem algum voto nos processos que julgam. Gilmar Mendes é criticado por agir ora como juiz, ora como político. Deveria, pelo cargo que ganhou de graça, sem concurso, no mínimo comportar-se como juiz, que é o que se pressupõe que deva ser.
       No Congresso Nacional, então, vimos duplas situações nos últimos 30 anos. A presença do elogio mútuo ou a agressão verbal exacerbada: “Vossa Excelência é um corrupto, um ladrão”! – Ora, se é corrupto ou ladrão não pode ser “Excelência”, não acham, amigos leitores? Isso quando não tentam um meter o braço no outro. O respeitar para ser respeitado, passa longe de Brasília!

Euclides Riquetti – Escritor – Minha coluna no Jornal Cidadela - Joaçaba - SC -  em 17-07-2020





Um comentário:

  1. A teu artigo tem muito de verdade:, porém, permita-me fazer algumas observações:
    bolsonaro calado é um alívio geral, de Brasilia a Pequim. Ele consegue aliar perfeitamente incompetência, entreguismo e maldade. Nisso ele é mestre.
    Não sou admirador do ministro Gilmar Mendes e acho que você tem razão quando diz que, muitas vezes se comporta como juiz, outras como político. Infelizmente, Gilmar não é caso único, até as pedras sabem do comportamento político no STF, MP, PF_... em todos as lambuzeiras ocorridas de 2013 para cá ( Mensalçao, Lava Jato...), com a participação ativa da mídia venal sempre batendo no PT, em Lula e Dilma, preservando FHC, Serra, Aécio, o PSDB enfim. Fizeram tudo para devolver o governo ao PSDB -, não conseguiram -, tiveram que se contentar com o bolsonaro já que no econômico todos concordam com Chicago Boy, Guedes.
    Agora, com relação aos nossos generais, Gilmar está coberto de razão, acertou na mosca É vergonhoso aquilo que as Forças Armadas, com muitas exceções, é claro, estão fazendo. Ao respaldarem as barbaridades de bolsonaro são cúmplices também.
    Faça um levantamento e veja a quantidade de militares que estão neste desgoverno. Dá vontade de chorar, afinal a Constituição diz que às Forças Armadas cabe zelar pela segurança da nação, não fazer o que estão fazendo: Aposentadorias la em cima, frequentes aumentos de salário... Não posso concordar com isso. Os generais do !Haiti", são os verdadeiros capitães do mato do Império, escondidos atras de um macartismo anacrônico tentam, perante a um povo mal informado, justificar todas essas maldades.
    E têm coragem de chamar isso de democracia. Coisa feia...!

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