Prédio do antigo Seminário Camiliano, em Iomerê, hoje abriga a
Prefeitura Municipal daquela cidade.
Por que meu pai teve que abandonar o seminário? Ainda bem...
Na década de 1950, as cidades de Santa Catarina eram muito
pacatas. As do Oeste e Meio-Oeste Catarinense eram pequenas. Seus
moradores vieram entre 30 e 50 anos antes, a maioria originários da
Serra Gaúcha, onde se situam Caxias do Sul, Farroupilha, Bento Gonçalves
e outras cidades, cujos distritos originaram muitas outras. Eram filhos
e netos de imigrantes italianos, que ali chegaram a partir da década de
1970. Meu familiares, de parte de minha mãe, os Baretta, chegaram em
1876. Os Richetti vieram de datas próximas às deles. Para Santa
Catarina, para o antigo Distrito de Abelardo Luz, o primeiro nome da
vila onde hoje se situa o Município de Ouro, vieram em meados da década
de 1920. Meu pai, Guerino, nasceu em 1921, e minha mãe, Dorvalina
Adélia, em 1923. Viraram moradores da Linha Bonita, embora meu pai
tenha morado em outras paragens do nosso antigo Município de Cruzeiro,
hoje Joaçaba.
Ouvir as histórias que eles e os tios me contavam sempre me foi muito interessante. Ser antigo me permitiu ter vivido quando ainda nem se sabia que TV existia. E, rádio, só alguns tinham. Dizem que na época da Segunda Guerra Mundial, quando as pessoas iam para a cidade (1939 a 1945), passavam na casa do André e da Dona Elza Colombo para saber notícias da Guerra, pois havia expedicionários nossos combatendo na Europa, mais precisamente na Itália.
Foi justamente durante essa Grande Guerra que meu pai fugiu do Seminário, do Instituto São Camilo, de São Paulo. Com nove anos (1932), ingressou no Seminário de Iomerê, ele e outros vizinhos, um Boaretto, tio do Leonir, Prefeito de Capinzal, o Albino Baretta, Padre que faleceu há poucos anos, e não me recordo bem qual o outro.
Em 1994 realizamos, na Linha Bonita, o Primeiro Encontro da Família Baretta, idealizado pelo amigo Albino Baretta, não o Padre, mas o filho do Pierim. O Catequista, Ministro da Eucaristia, que cuidou do irmão dele, paraplégico, o Neto, por cerca de 30 anos e que mora em Capinzal. Foi uma festa e tanto. Vieram familiares de diversos estados brasileiros. E também veio, de São Paulo, o outro Albino, o Padre, que já estava velhinho, com mobilidade limitada. Perguntei-lhe se fora amigo de meu pai, em São Paulo. Ele nada respondeu. Mais adiante o primo Rozimbo me contou o porquê de o Albino não gostar de meu pai e eu o compreendi. Fiquei muito contente por ele não gostar de meu pai. A Festa da Família Baretta foi algo bonito. Repetiu-se uma vez, mas depois não mais aconteceu.
Devo minha vida justamente ao Padre Albino Baretta. Albino significa "alvo", "branco", bem claro. Mas foi justamente porque ele era inquieto, e aquele que viria a ser meu pai também, que eu existo. Senão vejamos:
Os seminaristas do São Camilo, de Iomerê, foram todos para São Paulo, na Vila Pompéia, onde meu pai ficou de 1932 a 1942, tendo, então, 19 anos. Fez ali o Colegial, equivalente ao hoje Ensino Médio, que já foi Segundo Grau. Estudava Filosofia que, pela regra, são dois anos de Filosofia e três de Teologia para que o Noviço se torne Padre. Meu pai usava batina escura, era alto e magrão, tinha óculos clássicos. Aprendera Canto Orfeônico, Francês, Italiano, até tocava piano e órgão. Gostava muito de História e Geografia, tinha sempre excelentes notas. Mas também gostava de trabalhar, costume ou hábito de todos os descendentes de italianos. Sabia lidar com o serrote, o martelo, a marreta, o nível, o metro, a colher de pedreiro, o esquadro. Os mais limitados iam de enxada, foice, picareta... Ele, bom de cálculo (ensinou-me a calcular medições de terras e volumes quando eu estava no segundo ano primário), era pedreiro. E, no Seminário, sempre havia o que fazer. Herdara do Nono Frederico as habilidades.
Bem, num dia daqueles, estava meu pai a construir uma cancha de bochas, lá na Vila Pompéia, quando o colega Albino Baretta começou a dar palpites, em vez de ajudar. Meu pai deu-lhe uma marretada no dedão de um pé e foi sangue para tudo o que é lado.
À noite, a Cúpula Diretiva do Seminário, embuída do maior senso de justiça, reuniu-se para decidir o futuro do rebelde Guerino. Era uma decisão difícil, que ficou adiada para a manhã seguinte. Precisavam analisar tudo, calmamente, mas, à espreita, o réu já percebia que seu destgino seria a rua, a expulsão, uma vergonha para a Família Italiana, em plena Segunda Guerra Mundial. Então, enquanto todos dormiam, jogou uma trouxa de roupas pela janela do quarto, saiu devagarinho e silenciosamente pelo corredor, sem ser percebido, e adeus seminário. É por isso que o Padre Albino é responsável por eu existir. E, terei imenso prazer erm lhe proporcionar, cara leitora, a continuidade dessa história, em próxima crônica. Enquando isso, a Marjorie Estiano e a Fernanda Montenegro ganham um descanso merecido.
Euclides Riquetti
25-03-2012
Ouvir as histórias que eles e os tios me contavam sempre me foi muito interessante. Ser antigo me permitiu ter vivido quando ainda nem se sabia que TV existia. E, rádio, só alguns tinham. Dizem que na época da Segunda Guerra Mundial, quando as pessoas iam para a cidade (1939 a 1945), passavam na casa do André e da Dona Elza Colombo para saber notícias da Guerra, pois havia expedicionários nossos combatendo na Europa, mais precisamente na Itália.
Foi justamente durante essa Grande Guerra que meu pai fugiu do Seminário, do Instituto São Camilo, de São Paulo. Com nove anos (1932), ingressou no Seminário de Iomerê, ele e outros vizinhos, um Boaretto, tio do Leonir, Prefeito de Capinzal, o Albino Baretta, Padre que faleceu há poucos anos, e não me recordo bem qual o outro.
Em 1994 realizamos, na Linha Bonita, o Primeiro Encontro da Família Baretta, idealizado pelo amigo Albino Baretta, não o Padre, mas o filho do Pierim. O Catequista, Ministro da Eucaristia, que cuidou do irmão dele, paraplégico, o Neto, por cerca de 30 anos e que mora em Capinzal. Foi uma festa e tanto. Vieram familiares de diversos estados brasileiros. E também veio, de São Paulo, o outro Albino, o Padre, que já estava velhinho, com mobilidade limitada. Perguntei-lhe se fora amigo de meu pai, em São Paulo. Ele nada respondeu. Mais adiante o primo Rozimbo me contou o porquê de o Albino não gostar de meu pai e eu o compreendi. Fiquei muito contente por ele não gostar de meu pai. A Festa da Família Baretta foi algo bonito. Repetiu-se uma vez, mas depois não mais aconteceu.
Devo minha vida justamente ao Padre Albino Baretta. Albino significa "alvo", "branco", bem claro. Mas foi justamente porque ele era inquieto, e aquele que viria a ser meu pai também, que eu existo. Senão vejamos:
Os seminaristas do São Camilo, de Iomerê, foram todos para São Paulo, na Vila Pompéia, onde meu pai ficou de 1932 a 1942, tendo, então, 19 anos. Fez ali o Colegial, equivalente ao hoje Ensino Médio, que já foi Segundo Grau. Estudava Filosofia que, pela regra, são dois anos de Filosofia e três de Teologia para que o Noviço se torne Padre. Meu pai usava batina escura, era alto e magrão, tinha óculos clássicos. Aprendera Canto Orfeônico, Francês, Italiano, até tocava piano e órgão. Gostava muito de História e Geografia, tinha sempre excelentes notas. Mas também gostava de trabalhar, costume ou hábito de todos os descendentes de italianos. Sabia lidar com o serrote, o martelo, a marreta, o nível, o metro, a colher de pedreiro, o esquadro. Os mais limitados iam de enxada, foice, picareta... Ele, bom de cálculo (ensinou-me a calcular medições de terras e volumes quando eu estava no segundo ano primário), era pedreiro. E, no Seminário, sempre havia o que fazer. Herdara do Nono Frederico as habilidades.
Bem, num dia daqueles, estava meu pai a construir uma cancha de bochas, lá na Vila Pompéia, quando o colega Albino Baretta começou a dar palpites, em vez de ajudar. Meu pai deu-lhe uma marretada no dedão de um pé e foi sangue para tudo o que é lado.
À noite, a Cúpula Diretiva do Seminário, embuída do maior senso de justiça, reuniu-se para decidir o futuro do rebelde Guerino. Era uma decisão difícil, que ficou adiada para a manhã seguinte. Precisavam analisar tudo, calmamente, mas, à espreita, o réu já percebia que seu destgino seria a rua, a expulsão, uma vergonha para a Família Italiana, em plena Segunda Guerra Mundial. Então, enquanto todos dormiam, jogou uma trouxa de roupas pela janela do quarto, saiu devagarinho e silenciosamente pelo corredor, sem ser percebido, e adeus seminário. É por isso que o Padre Albino é responsável por eu existir. E, terei imenso prazer erm lhe proporcionar, cara leitora, a continuidade dessa história, em próxima crônica. Enquando isso, a Marjorie Estiano e a Fernanda Montenegro ganham um descanso merecido.
Euclides Riquetti
25-03-2012
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