quarta-feira, 9 de dezembro de 2020

Dionísio Ganzala - Cabo do 5º BE - padrinho e afilhado! Anos 1970...

 





Relembrando de amigos...
          Recebi, no sábado, a informação do falecimento do amigo Dionísio Ganzala. Ligou-me sua sobrinha, Kátia Bazzo, minha ex-aluna, ex-colega de trabalho, que mora em Ouro. Ela sabia do carinho e apreço que eu tinha por ele. Fiquei muito triste por ele ter partido. Um pouco mais velho do que eu, natural do interior de Campos Novos, localidade de Pouso Alto, perto do Rio Pelotas, no hoje município de Zortéa. Conheci-os em União da Vitória, em março de 1972. Era Cabo do Exército Brasileiro, servindo ao 5º BE, em Porto União.

          Fui convidado pelo conterrâneo Leoclides Frarom, o Leo Fra, para morar na "República Esquadrão da Vida", localizada na Rua Professora Amazília, 322, bem em frente a onde se localiza o Banco do Brasil, em União da Vitória. Era uma casa de madeira com frente em alvenaria, amarela. Formamos uma turma de 10 jovens, todos estudantes, a maioria universitários. A antiga "CABOLÂNDIA" que antes abrigava cabos do 5º BE, estava hibrizada, agora com muitos civis, pois os que se desligavam do Exército, acabavam trabalhando em bancos e na iniciativa privada.

          Aderbal Tortato era ex-Cabo e trabalhava no Banco do Brasil. Mineo Yokomizzo e Francisco Samonek eram meus colegas de Letras na Fafi e também atuavam no BB. Evaldo Braun e Osvaldo Bet em companhias que construíam rodovias. Odacir Giaretta era moveleiro. E havia os Cabos Frarom, Backes (João), Dionísio (Ganzala). Depois vieram os Cabos Figueira (local), Maciel (Concórdia) e Godoi (Caçador).  E o Boles (Boleslau Myscza ), taxista e depois empresário, virou hoteleiro (Rio Hotel). O Aclair (Dias), também Cabo, que veio de Caçador, já havia buscado outro rumo, casara com uma bela de uma loira. O mesmo acontecera com o Cabo Arnaldo Della Giácomo. Também moraram conosco o João Luiz Agostini, seu irmão Carlos, que estão em União da Vitória, e o Eduardo Bet, de Bituruna, que fez carreira militar em Brasília. O Celso Lazarini, que jogou no Iguaçu, e está morando no Porto. Lodovino Pilatti, de Tangará, era uma espécie de convidado, também se alojava lá nos tempos de FAFI. Tínhamos um grupo com muita força intelectual e até física.

          O Dionísio era uma "santa alma". Um cidadão muito simples, levantava de madrugada e, às 5 horas, era normal ouvi-lo fazendo exercícios físicos e tomando banho com o chuveiro desligado naquelas madrugadas frias de inverno, que só quem morou lá sabe como é. Maior do que eu, que tenho 1,83 metros. Muito forte, um gigante. Competia nos jogos do Batalhão. Rastejava na lama sob arame farpado, subia pelas redes, pulava obstáculos, era um exímio remador. Corria atletismo e, nas marchas a pé, ia até São Mateus do Sul com seus companheiros. Nem cansava. Assim era meu colega Dionísio, com quem desenvolvi grande afinidade por sermos oriundos da mesma região.

          Fui estudar Letras e não tinha boa base em Inglês. Ele me deu seu livro básico para eu fosse resolvendo exercícios (ele estudava no São José, num curso intensivo que denominavam de mini-Ginásio, à noite). Depois, vendo que eu gostava de jogar bola e não tinha chuteiras, deu-me sua "Gaetta nº 43", que ficava um pouco folgada no meu pé, mas que quebrava o galho. Era assim o amigo. O que era seu era dos outros também.

          Quando criaram a Loteria Esportiva, começou  a jogar adoidadamente. Ensinou-me que "zebra" era quando um time grande perdia para um pequeno.  Era muito festeiro, frequentador de casas noturnas, de todos os ambientes possíveis. Fazia sucesso com as gatas. Me apresentava aos outros como "Sargento Riquetti", pois eu havia raspado o cabelo ao passar no vestibular e parecia mesmo um milico. Dava-me moral. Contava-me suas histórias de pescarias e caçadas na beira do Pelotas. Tinha planos, mas teria que deixar o Exército porque não conseguira estabilizar a "QM", como dizia ele.

          Aplicou suas economias de cinco anos num Fundo de Investimentos que quebrou e ele ficou sem nada. Saiu do batalhão e não tinha mais tudo o que economizara. Mesmo assim, com um colega do Exército, que era de Concórdia, compraram a"Boite Karandache", que acabaram vendendo porque há uma diferença muito grande entre você ser frequentador e ser administrador.

          Num fim de tarde, chegou um recado através de um vizinho, um funcionário gentil da Copel que tinha telefone: seu pai havia falecido em Pouso Alto, interior de Campos Novos. Veio com o Corcel 4 portas do Boles para dar adeus ao seu progenitor. Em razão disso, voltou para o sítio da família, definitivamente. E, quando fui morar em Zortéa, encontrei-o no escritório da Zortéa Brancher, onde eu trabalhava à tarde no Financeiro e lecionava pela manhã e noite na Escola Major. Ele, por sua vez, estava lecionando na Escola Municipal de Três Porteiras, ali perto de onde morava.

          A vida dele deu uma guinada extraordinária. Um dia, disse-me: "Riquetti, você sabe tudo o que eu já fiz na minha vida, de bom e de ruim. Mas agora estou com Deus. Fui um pecador, mas agora deixei de ser. Deus é minha vida e meu norte é a Bíblia". E o Cabo Dionísio, que baixara das Forças Armadas como Terceira Sargento da Reserva, era um soldado de Deus. Ficava muito nervoso quando as coisas saíam do rumo, defendia a moral e os bons costumes.

          As pessoas o jugavam doido, mas eu o compreendia e respeitava. Fora um bravo soldado no 5º BE e era o responsável pelo "Paiol de Munição", um serviço que era outorgado somente para pessoas de extrema confiança do Comando Militar. Um atleta vigoroso e obstinado e eu ficava chateado porque as pessoas não davam a ele o devido valor. Muitas vezes, as pessoas tratam os outros pelas aparências, sem conhecer as virtudes que eles têm. Nos últimos anos, juntou-se aos companheiros de Igreja, fez pregações, realizou batizados nos rios, foi servente de pedreiro, agricultor e até participou dos Movimentos  dos  Sem-terra. Eclético, nunca perdeu a candura...nem sua alma deixou de ser nobre, nem seus gestos deixaram de ser polidos!

          Ele e o Cabo Backes me apelidaram de "Alegria". Também me chamavam de "Sorriso". E o Backes o chamava de "Triste". Coisa de jovens! O Jair Backes, que é meu vizinho aqui em Joaçaba, informou-me que o Backes, João, seu irmão, o Cabo, faleceu há três anos,  no Mato Grosso. Tinha casado com a namorada, Holga, me parece, que era vendedora na Loja Vencedora, ali em União da Vitória.

          Ontem escrevi um poema que postei no meu blog: "No dia em que você partiu". Era minha homenagem aos amigos que se foram. vale para o Dionísio, o Backes, o Godoy, que fez carreira no Exército e já faleceu. Enquanto escrevia, as lágrimas dificultavam-me ver a tela do computador. Amigo verdadeiro é sempre amigo verdadeiro! Que os três amigos se encontrem lá no céu e possam continuar com o lema de nossa república de estudantes do início da década de 1970: "Neste Natal, nós, da República esquadrão da Vida, estaremos alertas e vigilantes". E continuamos sempre vigilantes, rezando pelos amigos que se espalharam pelo Brasil, tiveram suas famílias e são pessoas muito honradas.


           O Dionísio sempre me procurava lá em Ouro. Imaginei que aquela fortaleze devesse durar 100 anos! Mas não foi assim, infelizmente. Tenho algumas histórias que eu poderia escrever sobre ele. Quem sabe, num sonho, ele me autorize a contar. Ao contrário, serão segredos que ficaram em mim e nas pessoas que melhor o conheceram... De qualquer forma, em algumas ocasiões, pude ajudá-lo a resolver problemas seus. Ele me dizia que eu era "seu padrinho". E eu dizia que não, que era ele que era meu padrinho, desde os meus 19 anos, lá no Porto. Importa-nos, tanto a mim quanto a ele, que éramos amigos e o que eu posso fazer por ele é rezar e poder dizer aos amigos quem ele foi, o que foi, e quanto bom ele foi.


Grande abraço, amigo Dionísio, de seu amigo Riquetti, "sempre alerta e vigilante"!

Euclides Riquetti
07-09-2014

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