Caminhão Ford F - 600 - modelo igual ao do primo Rozimbo Baretta
A melodia me transportava para as estâncias gaúchas, para nossos pampas sulinos, onde as patas dos cavalos sulcam os carreiros em direção ao gado que pasta. O sol está-se escondendo atrás do morro, tornando nosso céu decorado por cores de indescritíveis matizes. Cada um de nós se ocupa com o que tem à mão: TV, telefone celular, computador, forno de microondas... De repente, tudo escurece e alguém gita: "Faltou luz!" - É a Jujuba, que ainda pouco presenciou em sua vida essa questão de "faltar luz".
Em poucos segundos, todos os recursos disponíveis acionados: fósforos, velas, lanterninha de celular, pires para grudar as velas. (Duvido que, em sua casa, você nunca tenha usado um pires ou um cinzeiro para colar uma vela nessas ocasiões...) E a volta à normalidade (ou anormalidade?) - sem luz nas lâmpadas! Hora de ir ao encontro da realidade!
A Jujuba ensaiou um pequeno choro, na verdade um resmunguinho de nada, fui logo imitando alguns animais, latindo, uivando, miando, fazendo "óinc", e ela foi adivinhando qual animal era. A Mama Ine e a Vó Mi começaram a mover as mãos, formatando e projetando sombras e bichos nas paredes, e ela, rindo, adivinhava que bicho era aquele. E falava: "Ih, sem luz não dá para ver desenho na TV! Nem dá pra tomar banho!" E, em poucos minutos, uma "brain storm" já estava instalada em nosso ambiente familiar. E a Jujuba, espreitando pelo janelão do poço de luz: "Olha lá, tem uma estrelinha lá no céu! Como é bonita!"
Pela sacada, pude ver que na parte baixa da cidade e nas bandas da Unoesc a luz retornara. Comentei: " É só aqui no alto que está faltando luz. Algum carro deve ter batido num poste. Quando isso acontece, ficamos sem luz por um tempo, mas logo ela volta!"
E a Julinha, com aquele seu jeitinho bem opinativo, me vem com essa: "Sabe, vovô, nas ruas tem muita gente comendo banana e jogando casca no chão. Se as pessoas pisam na casca, elas escorregam e caem. O pneu do carro deve ter escorregado na banana, derrubado o poste e daí ficamos sem luz!"
E agora, velho?! Bem, rimos, vivemos meia hora de encantos, de diálogo, de alegria, coisa inexplicável. E lembrei-me das vezes em que faltava luz em minha infância, quando eu, meus irmãos e meus pais ficávamos na varanda defronte de nossa casa, lá no tempo em que tudo era Capinzal, olhando para a ponte, esperando que algum carro passasse e nos trouxesse luz. Naquela época, naquela mesma ponte onde agora passam dezenas de carros por minuto, tínhamos que esperar, muitas vezes, até meia hora para que passasse um. E nós acreditávamos que os caminhões, principalmente o F-600 do Rozimbo Baretta, meu primo, nos traria de volta a luz, que muitas vezes demorava até dois dias para voltar. Mas, coincidência ou não, logo depois que o caminhão apontava lá perto do Cine Glória, no máximo quando se perdia lá na rua da cadeia, retornava a luz. Saudades disso também...
Bendita a falta de luz no anoitecer de ontem. Apenas meia hora, mas tempo suficiente para vermos que há outros modos de se viver mesmo sem termos à mão nossas comodidades e tecnologias. Como antigamente!
Euclides Riquetti
06-10-2013
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